sexta-feira, 3 de julho de 2009

DIVÃ

Não sei se compreendi bem o recado do filme Divã, baseado no romance homônimo da Martha Medeiros. É uma história simples, cheia de lugares comuns, quase uma decepção como filme. O seu maior mérito está, talvez, em “surpreender” com o óbvio, já que as metáforas (se é que elas existem) não funcionam bem na história.
E o óbvio se revela avassalador quando a personagem Mercedes – uma quarentona simplória, vivida por Lília Cabral, que tal qual adolescente acha que a felicidade pode aparecer em qualquer esquina... - se despede do divã, quer dizer do analista, descobrindo que “vida é falta de definição; não tem a porta certa, não tem o mapa da mina, o mapa muda toda hora...”.
Simples, né! Pois o mundo é isso mesmo e nós somos postos à prova uma, duas, mil vezes. Várias portas se abrem e a gente escolhe: entrar em uma, ou em várias delas. Um trabalho só ou diversos? Bater cartão ponto na mesma repartição por 30 anos, ou correr mundo, correr perigo? Um amor, ou múltiplos amores? Um casamento ou dois, ou quatro ou cinco? Dizer “sim”, ou dizer “não”; viver exposto, ou fechar-se; dar ou não dar?
Todas essas portas se abrem diariamente para nós, aos 20, aos 40 anos, pela vida toda. E onde está a porta da felicidade, afinal? Estará na primeira que a gente abre, na segunda, ou naquelas que a gente desviou e não tentou abrir? A resposta parece óbvia, já que a felicidade só pode estar mesmo é na decisão que a gente tomou, seja ela qual for, embora isso não elimine o direito de querer mais, ainda que a gente não saiba direito o que é esse “mais”, que todo mundo busca, mas que ninguém conhece.
Ninguém pode ser feliz se não compreender bem a própria vida, se perder o interesse pelas escolhas que fez e viver remoendo as escolhas que deixou de fazer. Pouco importa, na verdade, se tivemos um ou mais trabalhos, um ou mais amores, um ou mais casamentos; pouco importa se vivemos sempre no mesmo lugar ou se corremos o mundo. Existem ricos frustrados e pobres realizados, existem cultos depressivos e iletrados bem resolvidos; existe gente feliz e gente infeliz tanto em Arroio Grande como em Paris.
Quanto ao romance da Martha, não sei por que não li, mas Divã, o filme, se não convence quando tenta mostrar que “o importante não é ser feliz; o importante é ter uma vida interessante” (Mercedes é caricata demais para passar essa mensagem), tem ao menos um mérito: faz com que a gente perceba, com certa facilidade até, que se a gente nunca vai saber de antemão qual é a porta que vai nos levar à felicidade, às portas contrárias – da angústia, da tristeza, da depressão; as portas da infelicidade -, estão permanentemente ao nosso alcance.
Dependendo de como a gente entender isso, aliás – isto é, de que nós não somos o resultado das nossas escolhas, mas o resultado do interesse por essas escolhas -, vai depender também o nosso comportamento diante do filme. Ou a gente acaba abatido, pensando que perdeu as portas certas, ou termina com uma leve sensação de felicidade, pela descoberta das escolhas que fez.

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