sexta-feira, 9 de maio de 2008

BARULHO

Sou um homem urbano. Gosto de barulho. O silêncio da campanha ou das praias desertas me incomoda. Qualquer silêncio me incomoda. Preciso de barulho, mesmo na solidão, e mais ainda nela. Preciso de barulho pra pensar, pra trabalhar, pra dormir... Preciso de barulho pra tudo. Nunca tive dor de cabeça, muito menos a tal enxaqueca, e nem ressaca, apesar da cerveja e do vinho praticamente diários. Quando deito - de ouvidos ligados nos possíveis ruídos da madrugada - já começo a pensar no barulho da manhã seguinte.
É verdade que não gosto de falar com ninguém em seguida que acordo, nem de atender telefone, nem de dar “bom-dia”, nem de nada. Necessito de uma meia hora pra remoer a minha rabugice, a minha falta de humor. E não gosto de fazer barulho, mas não me importo com o barulho dos outros. Gosto que falem comigo sem que eu precise responder, sem que eu nem precise ouvir, gosto de ligar o som, a tevê, a internet, tudo que faz barulho ao mesmo tempo; começar o dia com a sinfonia inequívoca dos inúmeros sons da cidade.
Sou um apaixonado pelas rádios AM, por programas ao vivo – tipo aqueles do Jorge Américo ou do Papaco - onde o ouvinte participa por telefone e fica conversando com o apresentador sobre música, sobre novela, sobre a rua onde mora, sobre cachorro, gato, sobre tudo... Gosto de ouvir essas conversas. Os programas de rádio têm vida, retratam seres humanos, gente do dia-a-dia; não esse comportamento engomadinho da televisão, onde âncora e entrevistado parecem ter saído de uma máquina-de-passar-gente direto pro estúdio, e sem direito a desalinho. Na tevê só acho graça nas mesas-redondas, e com discussão, quando fica a expectativa sobre qual será o resultado de uma conversa onde ninguém se entende.
O barulho pra mim funciona como uma receita; é um ótimo remédio contra o desânimo, um antídoto contra a depressão. E as pessoas barulhentas podem até ser mais chatas, mas, paciência, chato é chato de qualquer jeito.
É claro que não se pode confundir barulho com impertinência, agitação com balbúrdia, alvoroço com tumulto. O barulho - assim como o frege e a bagunça - tem que ter um mínimo de disciplina, um pouco de “modos”, um mínimo de organização. É isso: eu gosto de barulho organizado, de barulhentos com modos, de ruidosos elegantes...
Sou um homem urbano, gosto e preciso do barulho – mas de um barulho fraterno, gentil, educado -; portanto, em respeito a essa necessidade de ruídos civilizados, peço, reclamo, imploro, que, por favor, nunca, mas nunca mesmo, gritem perto dos meus ouvidos ou dos ouvidos de quem quer que seja.
Porque aí já não é barulho, é falta de educação!

Nenhum comentário: