sexta-feira, 23 de outubro de 2009

FRUSTRAÇÕES

Eu tenho três frustrações na vida, todas irreversíveis. Não aprendi a falar inglês, não sei tocar violão e não consigo nadar mais do que dez metros. Tem um quarto fracasso, também, que foi o de não ter “ficado” com a loirinha da 7° ‘B’, quando ela mandou um recado de que estaria me esperando na esquina da Pracinha, depois da aula. Mas essa frustração já nem conta mais, perdi a menina para um colega no mesmo dia e a loirinha já deve ser avó há anos.
O tempo do Ginásio, aliás, é que veio me dar a exata noção da irreversibilidade de certas coisas, que se tornam irrecuperáveis com o passar dos anos. Os namoros que deixei de ter, a paixão platônica pela Professora de coxas grossas, a inter-série que não ganhei, pela falta mal apitada pelo Charuto, os "vales" que paguei para os guris maiores que eu, tudo, tudo sem recuperação, sem nova chance, sem direito à segunda época.
Depois, tiveram também as decepções da minha mãe, que queria que eu fosse Juiz ou Médico, mas, convenhamos, que filho do Pedro Bittencourt iria se sujeitar a passar a vida toda bebendo escondido?
Mas as minhas outras frustrações são derrotas mesmo; são definitivas, irrecuperáveis.
Quanto ao inglês, a minha capacidade de apreensão, hoje, com o winchester totalmente ocupado – processos para atender, contas para pagar, filhos a preocupar... -, me impede de absorver qualquer coisa “nova”, mesmo que seja uma velha língua como a english language, mesmo que esteja toda ela no computador, com tradutor on line dentro de casa, “isn’t truth?”.
Hoje, também o meu corpo reluta em se movimentar para uma pequena caminhada, ou para andar de bicicleta. Nadar, então, nem pensar, ainda mais com esse tempo aqui do Sul, com cada inverno que parece envelhecer a musculatura da gente pela vida inteira.
Também os meus dedos, agora, estão tensos demais para dedilhar um violão, meu ouvido piorou assustadoramente, e até o meu gosto musical deve estar comprometido, invadido que foi pelo pagode, pelo funk, pelo créu, por toda essa bobageira music que anda solta nas rádios, na televisão, nas ruas, nos emburrecendo diariamente.
Mas, a vida segue, e eu continuo admirando as pessoas que, com simplicidade, conseguem fazer coisas que para mim são difíceis, complicadas, verdadeiramente impossíveis.
Como passar uma camisa de gola, andar de motocicleta, aprender matemática, assistir um culto religioso, dançar um samba...; tudo difícil, impossível mesmo, irrealizável para mim.
A vida segue e eu vou me completando agora na realização dos outros, como no filho que toca violão, no sobrinho que é campeão de natação, na enteada que estuda inglês, e nos guris que, na maior cara de pau, chegam em todas as loirinhas de todas as sétimas, preenchendo a nossa mesa de velhos com histórias surpreendentes para quem tem apenas quinze anos.
A vida segue e eu permaneço acreditando ser capaz de superar as minhas frustrações não mais as realizando, mas simplesmente falando sobre elas.
Porque escrever sobre frustrações e conquistas, e sobre derrotas e vitórias, se tornou também irrecuperável dentro de mim. Ainda bem.

2 comentários:

Solismar Venzke Filho disse...

Carissímo. Frustações. Ó...todos nós temos. Uns identificam e aceitam. Outros, identificam, mas não desenvolveram a capacidade para aceita-lás. Ai é o pior, o sentimento de dor é maior.
A respeito da sua escolha. (Advogado ou Juiz/Médico) Me permite a dizer, você fez a escolha CERTA. "É melhor ser um bêbado conhecido do que um alcoolatra anônimo". Um abraço.
- Solismar.

Pedro Jaime Bittencourt Junior disse...

Sem exageros, Solismar, sem exageros...
Como dizem os próprios comerciais de bebidas: "aprecie com moderação!"
Abraço.