sexta-feira, 25 de julho de 2008

SONHO RECORRENTE


O leitor deve saber como é. Aquele sonho que aparece de vez em quando, sempre da mesma maneira e que a gente não consegue nunca lembrar o final. Surge quase sempre nebuloso, às vezes assustador, sem qualquer causa aparente, parecendo não ter nada a ver com as angústias ou as tensões do dia.
Sonho recorrente, eu tenho um.
Me acompanha desde não sei quando e aparece umas duas ou três vezes por ano, por aí. É o sonho do telhado se abrindo. Isso mesmo, o “teto” do quarto onde durmo “abre” e as coisas que se encontram acima dele se precipitam por todo o lugar. E eu fico ali, paralisado, imóvel, assistindo o mundo inteiro desabar. E as coisas vêm e vêm, e se aproximam cada vez mais. Pedaços de madeira, peças de ferro, papéis, quadros e até guarda-chuvas (o que torna possível que os guarda-chuvas perdidos se escondam mesmo em algum lugar do espaço). Tudo despenca: retângulos, cubos, sinos e pontas de estrelas que aparecem luminosas, numa velocidade incontrolável.
Quando tudo se junta, formando uma nuvem escura por sobre o quarto, como que anunciando uma enorme tempestade, eu sinto o corpo crispado, molhado de suor, até acordar de repente, procurando pelos objetos que ameaçavam cair.
É sempre assim, e os objetos nem despencam nem saem de cima, ficam somente girando, orbitando no espaço “vazio” do quarto.
É o chamado sonho recorrente, uma incomodação que está sempre na volta da gente; mais chato que bêbado falante, mais inconveniente que cliente que faz consulta na rua, o tal sonho recorrente.
Alguém já me disse que esse tipo de sonho está ligado à insegurança e revela medo de perder o que se tem ou algo parecido. Não sei, mas acho que não. Deve estar ligado a outro tipo de fragilidade; medo do ridículo, de ser atropelado na esquina, ou de comprar um carro com aquele adesivo “eu amo a minha esposa” e não poder tirar, ou de perder as calças na rua, sei lá. Um medo desses que a gente tem e que aparece de vez em quando, sem qualquer aviso.
O fato é que tal sonho incomoda mesmo, surgindo assim do nada, quase sempre no sono da noite.
Definitivamente, o sonho que eu queria era outro, sem suor nem cãibras, sem ameaça à casa própria ou ao senso do ridículo, sem que nada desabasse de repente, mas, se assim fosse, que o objeto a cair tivesse no máximo o peso da Gisele Bunchen, ou, vá lá, da Débora Secco, o que já seria de ótimo tamanho.

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