51,
Black House Road, Huddersfield, HD2-1 Ap, England... No dia 23 de
maio de 1990, há exatos trinta anos, eu estava desembarcando no
aeroporto de Lisboa, em Portugal, para viver uma aventura que atravessou alguns
meses. Dessa viagem, feita com inacreditáveis mil dólares no bolso,
eu poderia contar dezenas, talvez centenas de histórias. Mas
aventuras e viagens são muito pessoais, e, via de regra, se revelam
desinteressantes para quem não as viveu. Prefiro contar, então,
sobre esse endereço que aparece aí em cima. É que lá, em
Huddersfield, uma cidade de porte médio, ao norte da Inglaterra,
morava uma colega minha da época do Ginásio (o atual Instituto
Aimone). Uma amiga da mocidade, a Célia, filha do Erothildes Moraes,
o popular Agapito, e da Dona Amélia, que residiram durante anos no
Arroio Grande. Pois quando soube que eu iria para a Europa, o
Agapito, amigo e cliente do meu pai, me repassou o endereço da
filha, na Inglaterra. Por absoluta falta de dinheiro, eu não fui a
Huddersfield, visitar a Célia, que era uma colega muito querida,
minha e de toda a turma do colégio, nos primeiros tempos da nossa
adolescência. Tínhamos doze, treze anos, e éramos amigos, todos, e
nos gostávamos como se gostam os bons amigos. E pensávamos que nos
encontraríamos pela vida toda e que o nosso futuro seria tão
divertido como era o teatrinho que fazíamos na escola… Naquele
verão da Europa, de 1990, por absoluta falta de dinheiro – eu já
disse – eu não pude ir a Huddersfield, e acabei voltando para o
Brasil quase ao final do nosso inverno. A Célia ficou um período
por lá e, tempos depois, eu a encontrei, por acaso, em Pelotas, onde
conversamos sobre a minha “não ida” até a Inglaterra. Brincamos
e nos despedimos. Foi a última vez que eu vi a minha amiga. Soube,
mais tarde, que uma doença traiçoeira havia retirado a Célia
precocemente do nosso convívio. Desde então, nunca mais as
brincadeiras da Célia, nunca mais a sorriso da Célia, nem planos
profissionais, nem viagens, nem nada... Huddersfield nunca mais...
Também eu nunca mais retornei à Europa, para repetir aquela viagem
sobre a qual eu teria dezenas, talvez centenas, de histórias para
contar… Mas o que eu trago para agora, para estes dias de angústia
que todos nós estamos vivendo, com uma vontade enorme de abraçar as
pessoas queridas, é que se me fosse possível mexer no tempo, eu
pegaria a minha velha agenda de 1990, destacaria um endereço – 51,
Black House Road, Huddersfield, HD2-1 Ap, England – e, lá
chegando, entraria a passo na casa da cidade localizada quase na
fronteira com a Escócia. Só para abraçar uma amiga adorável.
Porque nós, os agora velhos colegas de adolescência, sempre
soubemos, todos, que na empatia da Célia, na queridice da Célia, no
seu enlevo, caberiam todos os abraços contidos do mundo...
sábado, 23 de maio de 2020
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