sábado, 12 de dezembro de 2009

KREK

Careca Chuy 80, uma década na frente, humanista, pacifista e iconoclasta; gerovita e alfa-centauro... transitando pelos caminhos austrais com destino ao epílogo Léo”...
Quem nunca ouviu essa apresentação deixou de conhecer uma das personalidades mais exóticas que se tem notícia, e que morou aqui no Arroio Grande, em meio aos anos 70.
Extravagante, irriquieto, criativo, Iraci Alves Nunes, o Careca – ou Krek, como se assinava – era natural de Santa Vitória do Palmar, e se criou com o meu pai lá pelo Chuy, de onde sairia para ser jogador de futebol, e dos bons, na década de 50. Vestindo as camisetas do Guarany de Bagé e do Nacional de Montevidéu, o Careca enfrentou nada mais nada menos do que o Vasco da Gama, base da Seleção Brasileira de 1950, e o Santos, do surgimento do menino Pelé, em partidas memoráveis.
Depois do futebol, quando estava tranquilamente administrando um Hotel da família em Santa Vitória, o Careca foi, por sugestão do meu pai, convidado para ser técnico do E. C. Arroio Grande, lá por 1975.
Foi a experiência mais louca que se tem notícia. As jogadas que ele treinava tinham nome - gerovital, alfa-centauro, epicentro... – e os jogadores eram chamados por apelidos estranhos, com nomes de satélites, planetas, galáxias, instaurando-se a maior confusão na verdadeira “Via Láctea” em que se transformou o Estádio da Avenida.
Os jogadores tinham que correr de costas, às vezes com os braços amarrados (para aprender equilíbrio, justificava o Careca); o goleiro treinava com os olhos vendados, para tentar imaginar onde a bola ia ser chutada, e ninguém entendia nada. O Ósca, o Wilson do Ary, o Marrequinho, o Paulão, todos, se olhavam e perguntavam: - Mas de onde saiu esse louco?!?
Não podia mesmo dar certo, o Careca não fazia parte deste planeta, como ele mesmo se identificava e como as suas atitudes reiteradamente comprovavam.
Uma ocasião, em plena ditadura militar (início dos anos 70), quando a repressão rotulava todos os que se opunham ao sistema de “terroristas”, o Careca resolveu criar um time de Futebol de Salão em Santa Vitória, e colocou logo o nome de... Terror Show FC. No primeiro jogo, levou para a Praça de Esportes uma faixa com os seguintes dizeres: “Paz, Amor e muita fé no Terror!”. Resultado: a estréia do time adiada e todo mundo preso, para dar explicações no Dops, a polícia política da época.
Histórias, histórias... O Careca tinha tantas que não cabem numa só crônica: como a do amigo tupamaro, segurança do Pacheco Areco, Presidente do Uruguay, e que vivia bêbado, se perdendo seguidamente do Presidente; ou da Tia Dorinha, que ele garantia que nos resolveria qualquer problema e, quando a gente ia pedir ajuda, ele arrematava: - Tudo bem, vou lá falar com ela, mas é quase certo que ela não vai querer. E ela nunca queria, realmente.
Quem conheceu o Careca pode afirmar que ele foi seguramente o louco mais louco que já passou por aqui, o que não é pouco nesta terra de malucos. E olha que nesse quesito eu tive experiência, e das boas, dentro da própria casa, mas o Krek foi mesmo imbatível, sem comparação, ao menos neste planeta.

Na primeira foto, no alto do texto, o Careca em Arroio Grande, fazendo o símbolo de "Paz e Amor", no dia 16 de fevereiro de 1975. Na foto de baixo, Careca erguendo a bandeira da Paz, onde se lê: "Os Alfa Centauros saudam aos terráqueos do Hermenas"; na Praia do Hermenegildo, ano de 1977.

2 comentários:

Ricardo Petrucci Souto disse...

Buenas, Juninho
Nunca tinha ouvido falar do Karek, mas do Terror sim.
O Orval o Fernando Plá e o Otávio Soares eram torcedores fanáticos do Terror.

Pedro Jaime Bittencourt Junior disse...

Grande Petrucci.
Pena não teres conhecido essa figura "extrordinaria" (expressão dele) que foi o Krek.
Eu não sabia que o Otávio era torcedor do Terror, já o Plá, sim.
Quanto ao Orval, ele foi também fundador do Terror (acho que quando trabalhava no Posto Ipiranga, da Avenida de entrada...), e todos os anos "multava" o Pedro - meu pai - com a anuidade do clube: um tênis, de número 39 a 41, para ser usado por um dos atletas do Terror.
Antes de a gente ia para o Hermena, no verão, o Pedro entrava na cidade e parava no Posto de Gasolina para "pagar" a anuidade; era sempre o Orval quem recebia e, incrivelmente, passava recibo em nome do Terror Show.
Que tempos!
Abraço.