Eu
nasci no fim do primeiro ano do início da década das revoluções.
Do século passado, naturalmente. Nasci antes dos movimentos de 68 e
depois da “movida” mexicana – Frida Kahlo, Diego Rivera
e Trotsky, e a aproximação de Che e Fidel, os protagonistas da
revolução cubana de 59.
A
criança que eu fui foi, como tantas, vitimada pelo golpismo de 64 e
atingida, via reflexa, pelos efeitos do AI-5 de 68. De forma
imediata fomos, todos, presa fácil do ufanismo patriótico do
“Brasil Ame-o ou deixe-o” dos anos 1970. “As praias do
Brasil ensolaradas lálálálá...” – Dom e Ravel – e as
irmãs Amarilho hasteando a bandeira toda a semana na Escola Dr.
Dionísio da Magalhães, na periferia pobre do Arroio Grande.
Em
contrapartida, pude conhecer a geração hippie dos anos 70, o
resultado do Woodstook americano de 69 – a combinação explosiva
de JJJ – Janis Joplin, Joan Baez e Jimy Hendrix –, sexo, drogas e
rock an roll, e as consequências do Vietnã de Keneddy e Nixon, e de
Kruschev e Ho Chi Min. Make love not war, dê carona ao
mochileiro... slogans em profusão, uma ideia na cabeça e uma
câmera na mão.
Resultado:
a Guerra Fria, a guerra suja... Brasil, 1964, Uruguay, 1973, Chile,
1973, Argentina, 1976... nós, feridos por uma sucessão de golpes,
amávamos a revolução, e ganhamos as ruas nas décadas de 70 e 80
para reivindicar, para cobrar, para exigir: democracia, liberdade e
justiça.
Ganhamos.
Mas perdemos a revolução. Ela, se acaso veio, não ficou. Passou.
Pelo País inteiro, pelo Estado e pelo Arroio Grande. Deve ter se
dirigido para os confins da América, voado sobre as geleiras da
Patagônia e vai ver que se atrapalhou lá pelas curvas do Cabo Horn
antes de aterrissar n'algum lugar do Atlântico ou do Pacífico.
Onde? Terra do Fogo ardente!?! Ushuaia libre?!? Punta Arenas free?!?
Aonde foi parar a nossa revolução???
A
revolução foi embora e nós deixou órfãos de sonhos e de
anfetaminas.
De
lá para cá uma ressaca só, única. Geração coca-cola, geração
celular, geração pc, notebook, tablet, ipod, chip no cérebro;
geração pqp.
Eu
nasci num fim de ano, como agora. E perdi.
Perdi
para o consumo, perdi para a falta de sonhos, perdi para a
desesperança, perdi para mim mesmo, perdi.
Feliz
fim de ano então, meu velho, mais um ano passado, perdido entre os
sonhos da juventude, as fantasias da velhice e a revolução que (nós
amávamos) e que não veio até nós.
Ao
final, resta apenas receber a nossa sentença – irreparável,
definitiva, sem direito a qualquer recurso... – da lavra de um JB
qualquer e amparada nos princípios editoriais da Folha, da Rede
Globo e da Veja: – Feliz ano novo, cidadão, afinal o senhor
acaba de negociar apenas mais um ano da sua vida!
A crédito e em suaves prestações, naturalmente.
A crédito e em suaves prestações, naturalmente.