segunda-feira, 26 de setembro de 2011

DON FRUTOS, ALDYR SCHLEE E O PRÊMIO JABUTI



O livro do Aldyr Schlee, Don Frutos, está entre os finalistas do Prêmio Jabuti, na categoria Romance.
O Jabuti – que já está na sua 53ª Edição - é um prêmio oferecido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) aos melhores livros de cada ano, no caso atual, ainda do ano de 2010.
Mais do que o prêmio vale, é claro, a indicação, pois o Jabuti, pela repercussão nacional que possui, proporciona uma visibilidade maior ao trabalho do escritor, o que, mesmo para nomes consagrados como Schlee, ainda e sempre é necessário.
A literatura se faz de leitores, e os leitores se fazem ante a notícia da literatura.
Don Frutos, para quem não conhece, é o grande romance do escritor jaguarense, baseado na vida do primeiro Presidente Constitucional do Uruguay, José Frutuoso Rivera (1788-1854), que viveu no Brasil por cerca de meia década, passando grande parte do ano de 1853 em Jaguarão, na fronteira com o Uruguay.
Com um trabalho que mescla ficção e realidade, fruto de extensa pesquisa, Schlee relata e divaga sobre esse ano em que Rivera viveu em Jaguarão, em especial os dias do inverno de 1853, até a saída do General do Brasil, o seu regresso ao solo oriental e a sua morte, próximo à Vila de Melo, em 13 de janeiro de 1854.
Don Frutos não é um livro fácil, pelo contrário, é bastante complexo, difícil até de resumir. Antes, é preciso realmente ler a obra de Schlee, saboreá-la lentamente, e preparar-se para o final, o final de um romance, igual ao final da vida, como descrito nas derradeiras palavras de Rivera ao Capitão Pedro Onetti, que o acompanhava, também antes do fim:
“Sabes, Pedro, que acabada na morte a vida, só o que fica é a memória?
Me diga outra cousa, Pedro: quem se lembrará de tudo isto?
- De quê, General?
De tudo, de todos... De mim, desde o começo até hoje, e deste tempo que estivemos em Yaguarón?

...
Pois quem ler Don Frutos, não esquecerá, Aldyr, de nada!


A vida do General D. Fructuoso Rivera (1788-1854) - Primer Presidente de La Republica Oriental del Uruguay -, contada no Romance de Aldyr Schlee, Don Frutos.

sábado, 24 de setembro de 2011

MUITO, MUITO, POUCO, POUCO



Passou o 20 de Setembro, um dos três momentos festivos da cidade: a Semana Farroupilha, o Carnaval e o Futebol, este último concentrado hoje nos jogos da Seleção local de Futsal.
A isso se resume a “movida arroio-grandense”, o nosso movimento, a nossa diversão. E isso, dependendo de como se queira ver, é muito, mas pode ser também pouco, dependendo de como se queira ver. Muito muito, ou muito pouco: escolham!!!
Mas, diante disso, isto é, do que se têm, existe ainda quem tire partido e aproveite para deitar falação sobre “o bem do povo”, “a satisfação do povo”, “o contentamento do povo”.
A alegria dos ingênuos medida pelos espertos.
Ah, Arroio Grande, o que estão fazendo contigo? Não percebes, por acaso, que os discursos da tua “tela quente” de segunda-feira – feios, sujos e malvados! – estão te atirando cada vez mais para o cada vez menos? Ou por acaso não sabes que os teus jovens – não tendo em quem se espelhar – já debocham de ti, e que o “AGDEPRÊ” é hoje mais do que uma simples atração no twitter, mas um verdadeiro recado para onde estão te levando as tuas pobres lideranças paroquianas?
O que afinal comemoraste nesta semana? O que sabem esses teus guris além de montar matungo, de colocar cachaça em garrafa pet e de se esbaldar em carne gorda? Onde estão os teus verdadeiros líderes, conhecedores da história, da tradição e dos ideais farroupilhas? Onde está o teu Bernardo Pires, o teu Barbosa Lessa, ou – vá lá! –, onde está o teu genérico do Paixão Côrtes?
Mas, tudo bem, o 20 de Setembro passou e logo tem futebol, e ano que vem tem Carnaval, e depois mais Semana Farroupilha, tudo para os nossos “gurizes” se esbaldarem de novo na cachaça e na cerveja, e no carreteiro e na carne gorda.
Ah, e no ano que vem tem eleição também, e desta vez sem o Jorginho, que fez as melhores Semanas Farroupilhas, que fez os melhores carnavais e a melhor Seleção da história da cidade. E se tudo o que ele fez, junto com a Mariela – e fizeram muito! –, ainda é pouco, imagina o que pode acontecer se eles vierem a ser substituídos por uns maturrangos qualquer, desses que não sabem distinguir um lobo-guará de um guaipeca, nem em política e nem em estética? Já pensaram?
Eu tenho pensado nisso e estou preocupado com o que pode vir por aí. Porque, além da Semana Farroupilha, do Carnaval e do Futebol, ainda é possível sonhar em viver numa cidade onde o discurso oportunista venha a ser substituído por uma atitude verdadeira de transformação, para o real “bem estar” de um povo que também tem o direito de querer mais, muito mais, além da Semana Farroupilha, do Carnaval e do Futebol.
Eu penso assim e acho que tem mais gente pensando assim também. Resta saber onde e de que lado eles estão.

Fotos ilustrativas: Desfile de 20 de Setembro - Site da Rádio Difusora

terça-feira, 20 de setembro de 2011

REVOLUÇÃO FARROUPILHA - O LENÇO FARRAPO




Um dos maiores símbolos da Revolução Farroupilha (ou Guerra dos Farrapos - 1835/1845), o Lenço Farroupilha foi idealizado pelo major Bernardo Pires, um gaúcho de Canguçu, diante da ideia preconizada pelos oficiais republicanos de dotar o movimento de um símbolo mais oficial para substituir o lenço colorado já adotado espontaneamente pelos Farrapos.
Encomendado, via Montevideo, em maio de 1842, para ser confeccionado nos Estados Unidos, a primeira carga do lenço foi descoberta e toda ela queimada (ainda dentro das caixas) pelos imperiais no Porto de Rio Grande; posteriormente, os lenços (provenientes de uma segunda encomenda) chegaram no acampamento volante dos republicanos em Piratini em dezembro de 1843, podendo os Farroupilhas finalmente apreciar a famosa quadrilha existente na indumentária:
"Nos ângulos do continente
O pavilhão tricolor
Se diviza sustentado
Por liberdade e valor".

Peça histórica envergada com orgulho pelos revolucionários já no final do decênio heróico (entre 1844 e 45), não se sabe quantos exemplares chegaram a ser utilizados após a grande queima de 1842, assim como é desconhecido o numero exato de lenços sobreviventes aos mais de 150 anos passados da Revolução Farroupilha.

O historiador Antônio Augusto Fagundes, o Nico (cujo artigo sobre o Lenço Farroupilha publicado na década de 1980 embasa este texto), fala na existência conhecida de apenas sete lenços originais: - um em Rio Grande, no acervo do CTG Mate Amargo, um na Biblioteca Pública de Pelotas, três no Museu Júlio de Castilhos, em Porto Alegre (um deles foi repassado pelo Governador Tarso Genro ao Museu Farroupilha, de Piratini, inaugurado na semana passada), um na coleção da Profª Vera Stédile, de Caxias do Sul, e um em uma escola não identificada de Porto Alegre - sem computar, entretanto, o lenço existente no Castelo de Pedras Altas, do Dr. Assis Brasil, cuja fotografia ilustra este texto, com o que teríamos o registro de oito lenços originais conhecidos em todo o Rio Grande.

Neste dia 20 de setembro, a data máxima dos gaúchos, este pequeno esboço sobre o Lenço Farroupilha, objeto ainda pouco estudado mesmo entre os historiadores que se debruçaram sobre a Revolução dos Farrapos ao longo dos anos.
Nas fotografias:

1) Réplica do Lenço Farroupilha adquirida pelo autor desta página;

2) Lenço original, existente no Castelo de Pedras Altas, fotografado pelo Dr. Sérgio Canhada, em visita que fizemos ao local há cerca de dois anos.

O Sérgio, aliás, escreveu magnífico artigo sobre o Lenço, que não consegui encontrar (que fim levou o blogdocanhada?) para reproduzir aqui.

sábado, 17 de setembro de 2011

LA REVANCHA*

Dia desses, vi no jornal uma fotografia do Jader Faria jogando xadrez num torneio na cidade. Lembrei imediatamente do tempo em que eram disputados os campeonatos de xadrez e de sinuca no Clube do Comércio, numa época em que a entidade ainda aglutinava os seus sócios quase que diariamente, embora já tivesse perdido a tradicional Biblioteca conservada por cerca de meio século.
Mas ainda havia boa diversão no Clube: jogo de cartas, de xadrez e de bilhar, e o Bar que, se já não era mais explorado pelo velho Solano, ainda servia bebidas e aperitivos honestos aos sócios do Comércio.
No xadrez, destacavam-se o Jorge Flôor e o Dr. Nilo Conceição, entre muitos outros de excelente categoria. Na sinuca, além do Herculano Ghan – um mestre do taco –, do Vinícius e do Prego, tinha também a turma mais nova, o Émerson, o Plínio, o Paulinho Freitas, todos bons conhecedores dos caminhos das mesas do Clube.
O Jader Faria costumava disputar os dois torneios – de xadrez e de bilhar – e era exímio jogador em ambos. Uma ocasião, eu, guri de uns 17 anos de idade, me inscrevi para disputar o campeonato de sinuca do Clube. Por azar, a minha partida de estréia caiu logo contra o Jader, e eu fiquei esperando na certeza de que iria me despedir do torneio já na primeira rodada.
Foi então que me ocorreu uma ideia. Já que os campeonatos eram disputados ao mesmo tempo, e tendo o Jader uma partida de xadrez marcada para o mesmo instante da sinuca que deveria jogar contra mim, acertei com a dupla que jogaria depois a inversão da rodada; assim, com a concordância dos disputantes, fiquei aguardando, enquanto o Jader enfrentava o seu adversário no xadrez – o temível Jorge Flôor.
O detalhe é que o Jader jogava o xadrez bebericando um bom whisky e quanto mais à partida contra o Jorge demorava, por parelha, mais aumentavam as minhas chances na sinuca que viria a seguir.
Assim eu esperei, e, depois de cerca de duas, três horas, foi assim que aconteceu.
Eu passei a partida toda “me ficando”, enquanto o Jader, cansado depois de uma longa disputa de xadrez e já com vontade de ir para casa, tentava converter bolas difíceis e errava, enquanto eu ia ficando e acumulando pontos, ficando e acumulando pontos...
Resultado: ganhei, por pouco, mas ganhei, e segui até a semifinal, que perdi, se não me engano para o Zé Guilherme, o Chaleira.
O Jader diz que eu joguei bem, o que deve ter acontecido mesmo, pois do contrário não teria a menor chance contra ele. Mas que aquele tempinho do xadrez contra o Jorge Flôor fez diferença, ah isso fez, e até hoje quando nos encontramos e brincamos sobre a possibilidade de uma eventual “revancha” na sinuca, eu respondo para o Jader que sim, que é possível sim, mas que sem whisky não, aí de jeito nenhum, não mesmo.


* Revancha, em espanhol, quer dizer também “vingança” (venganza), semelhante ao uso que se dá à expressão em português, onde ‘revanche’ significa oportunidade para recuperar uma perda, uma derrota, mantido, entretanto, o sentido de ‘desforra’.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A PROVA

Na crônica “Capitulação”, publicada em 02 de setembro último (3ª postagem abaixo), escrevi: “Sou um gremista de foto com Telê Santana, sou gremista que guarda revista com o Eurico Lara na capa...”.
Como, por estas bandas, a gente costuma sempre ser questionado sobre o que diz, publico aqui “a prova” do afirmado no texto; primeiro a fotografia, com quase duas décadas* de existência, e, posteriormente, aqui mesmo neste post, reproduzirei a capa da revista de quase meio século (está tão bem guardada que ainda não consegui encontrar).
* Verdade é que a fotografia é bem depois da passagem de Telê pelo Grêmio, ocorrida no final dos anos 70 (1977-1979). A imagem é do início da década de 90 e foi tirada em um vestiário em Buenos Aires, quando El Señor Santana, depois de disputar as Copas de 1982 e 1986 como técnico da Seleção Brasileira, dirigia o São Paulo (1990-1996), nesse dia em partida disputada contra o San Lorenzo, jogo de inauguração do Estádio El Nuevo Gasômetro, do tradicional Clube de Almagro, conhecido bairro da capital da Argentina. Estavam comigo o João Garcez e o Birinha, do Gita, ambos "cortados" na foto.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

DIONÍSIO



Neste último dia 7 de setembro eu pude voltar à infância, ainda que por alguns instantes. Foi nos festejos da Semana da Pátria quando, atendendo convite de Direção da Escola Dionísio de Magalhães, eu desfilei orgulhoso pela Dr. Monteiro ao lado dos professores e alunos do meu primeiro colégio no ano do seu cinquentenário.

Dionísio, a Escola da minha infância. Dos meus primeiros passos, as primeiras leituras, as minhas primeiras amizades. A escolinha pobre que eu e a minha irmã Nazine escolhemos pela pintura nova à época; uma ideia do meu pai que nos apresentou todos os colégios da cidade para que nós mesmos – na “autoridade” dos nossos seis, sete anos – pudéssemos eleger livremente onde queríamos estudar.

E escolhemos o Dionísio, e eu fui muito feliz lá.

Lá, eu conheci a simplicidade, e as dificuldades e limitações de uma pequena e nova Escola (o Dionísio tinha apenas cinco anos quando fui estudar lá), mas conheci também a dedicação e o esforço de toda uma comunidade para fazer dessa Escola um lugar digno para se conviver, principalmente para nós, alunos, que verdadeiramente amávamos o Dionísio.

Lá, eu conheci o trabalho das irmãs Aida e Alba, abnegadas, lutadoras, incansáveis a frente de todas as atividades da Escola. Lá, eu tive na Prof.ª Francisca uma diretora devotada e justa, e na Marlise Esteves a minha primeira professora, com um trabalho sério, correto, e uma dedicação desmedida a ponto de sofrer junto com os alunos que não conseguiam os melhores resultados.

Lá, eu conheci a Banda do colégio, ensaiada, ritmada, impecável, assim como impecáveis sempre foram os uniformes da Escola. No Dionísio, eu aprendi a dividir a merenda escolar, que era escassa, controlada, mas honesta, e repartida de forma solidária e fraterna entre os “filhos do Dr. Dionísio” que éramos todos nós.

Lá, eu fiz amigos para a vida toda, como a Clair, a Élida, a Roselaine, a Vera Lúcia, que vão ficar para sempre como boas lembranças entre as colegas do meu primeiro colégio. Assim como os guris do futebol, o Lita, o Leite, o Chorão, o Leivinha, e a turma dos “cientistas malucos” – o Rolnei, o Gustavo Pereira, o Zé Thomas –, símbolos de uma época em que a gente se divertia só de inventar os próprios brinquedos da gente.

Ah, Dionísio, Escola do meu coração. Como me fizeste feliz durante os meus primeiros anos de colégio, e como me fizeste feliz também agora, desfilando ao lado dos velhos alunos e dos teus novos estudantes e professores, que permanecem honrando a tradição de uma Escola que, para mim, continua sendo a mais simpática, a mais bonita, a mais perfeita, sem comparação com qualquer outra.

Por isso é que, neste dia 7 de setembro, apesar do mau jeito, apesar da idade, apesar do tempo que passou, eu não desfilei, eu não marchei, eu sequer caminhei pela Dr. Monteiro. Como um menino de seis, sete anos de idade, eu voltei à infância e sonhei, simplesmente.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

PERSONAGENS DO ARROIO GRANDE - (IV) OMAR BRETANHA DAS NEVES

Nascido em 05 de setembro de 1924, Omar Bretanha das Neves foi um político e pecuarista de Arroio Grande, falecido em 05 de agosto de 1999.
Filho de Análio Pereira das Neves e de D. Ondina Bretanha das Neves, Omar era irmão do conhecido Padre Neves, certamente o pároco mais popular da história de Arroio Grande.
Casado em segundas núpcias com a Sra. Omênia Maciel das Neves, Omar Bretanha era pai de três filhos – Maria do Carmo, Lúcia Maciel e Análio Pereira das Neves Neto.
Político de extrema habilidade, considerado uma verdadeira “raposa” pela classe política local, Omar foi o vereador de maior longevidade no Câmara Municipal, sendo eleito pela 1ª vez em 1959, pelo PSD, e pela última vez em 1992, pelo PDS. Ao todo, foram sete mandados como vereador, quase quatro décadas participando ativamente como protagonista da política local.
Homem acostumado às lides campeiras, Omar Bretanha dedicava-se também à Pecuária, criando gado no local conhecido como “Capão da Pombas”, interior do município de Arroio Grande.
Quando estava prestes a completar 75 anos de idade, Omar Bretanha faleceu, deixando saudades entre os seus familiares e conhecidos, e uma grande lacuna na classe política local, pois “política” era do que Omar mais gostava e sabia fazer como poucos em Arroio Grande.


São inesquecíveis para o autor desta página, as conversas que mantinha com Omar Bretanha - velho adversário partidário - na esquina próxima à residência do vereador em Arroio Grande, o que levou à publicação de uma crônica em sua memória - "O amigo de esquina" - no jornal "A Evolução", quando do falecimento do político no ano de 1999.


Nas fotografias, Omar Bretanha no começo da carreira política, nos anos 50 (no alto), e já septuagenário, pouco antes de falecer (abaixo).


sexta-feira, 2 de setembro de 2011

CAPITULAÇÃO

Teve um dia em que eu capitulei. Faz exatamente um ano, foi no dia 2 de setembro de 2010, eu baixei a guarda e... capitulei.
Dois de setembro é o dia do aniversário da minha filha Maria Eduarda, a Duda. Pois era o aniversário dela, de 12 anos, e eu até já havia dado o presente antecipadamente, quase um mês antes.
E presentes antecipados dão nisso: quando chega na hora do aniversário, ou a gente sente um imenso vazio por não ter o que presentear, ou então procura “suplementar” o presente que já deu. E foi isso que eu resolvi fazer.
Então, eu caminhei pelas ruas de Pelotas – onde mora a minha filha –, andei por duas ou três lojas, procurei a Andrade Neves no sentido Centro-Avenida e resolvi arriscar o ingresso num local de difícil acesso para mim: a loja oficial do Sport Club Internacional, o colorado de Porto Alegre.
Essa história, diga-se, possui dois antecedentes, que necessitam ser esclarecidos para uma melhor compreensão do que me aconteceu.
O primeiro foi quando a Maria Eduarda, então com pouco mais de 7 anos de idade, e tendo perdido a pouco o avô – o “Velho Pedro” –, me chamou e “pediu”, já definitivamente resolvida: - Pai, eu sei que tu és gremista, mas eu queria te pedir uma coisa. Eu queria 'ser do Inter' e agora que o Vô Pedro não ta mais com a gente, bem que eu podia ser colorado no lugar dele, né!? E eu ia dizer o quê diante de uma situação dessas? Eu podia opor o quê? Nada, não havia nada que eu pudesse fazer, senão concordar com o “pedido” da minha filha.
O problema é o segundo antecedente, conhecido dos que me acompanham desde a infância. Acontece que eu não sou apenas gremista. Sou um gremista que se criou, desde guri, vizinho do Gita e amigo do Agapito – craques do Grêmio – no Arroio Grande. Sou um gremista que foi a inauguração do Olímpico “Monumental”, em 1980, assistir o Grêmio jogar contra o Argentino Jrs., do Maradona. Sou um gremista que viu, de dentro do Estádio Olímpico, ali, pertinho do campo, o Grêmio ser Campeão da América, com o cruzamento sobrenatural do Renato, naquele inverno chuvoso de 83, em Porto Alegre.
Sou um gremista de foto com o Telê Santana, sou um gremista que guarda revistas com Eurico Lara na capa. Sou um gremista que saiu da frente da televisão, para não enfartar, quando o Juiz deu dois pênaltis para o Náutico e expulsou quatro jogadores do Grêmio, naquele que foi o maior épico da história do futebol mundial, quando, com 7 contra 11, o Grêmio ainda venceu a partida e voltou à elite do futebol brasileiro.
Pois eu, gremista de toda uma história, que acompanhou o Grêmio ao vivo no Olímpico, no Centenário, de Montevidéu, na Bombonera, em Buenos Aires, depois de quase meio século de extrema fidelidade, capitulei, e, no dia 2 de setembro de 2010, entrei no território inimigo, a loja oficial do S. C. Internacional, para comprar um presente para a minha filha,
E lá estavam todos os meus fantasmas: a camiseta vermelha, o escudo em 'S', o símbolo Saci... Lá estavam Figueroa, Falcão, Valdomiro; Chico Spina, “Uh” Fabiano, Fernandão... O Beira-rio, o Fernando Carvalho e – estarrecedor! – desde 2006, está lá também o Gabiru.
Mas o mais terrível, apavorante mesmo, foi descobrir que no fundo, bem no fundo, esses fantasmas vermelhos sempre estiveram ao meu lado nesses cinquenta anos. E que a partir de agora – por amor à minha filha – eu terei que conviver harmoniosamente com eles pelo restante da vida, e, o que é pior, com o tal de Leandro Damião junto.