No final de semana passado, eu fui até Pelotas para participar de um encontro de ex-militantes do movimento estudantil no período de 1977 a 1984, durante a ditadura militar.
Para começar, quero deixar bem claro que eu não tive nenhuma participação importante no movimento estudantil no referido período, muito embora tivesse feito parte do DCE do Direito da Federal, a convite do meu amigo Luís Carlos Gastal, que foi Presidente do Diretório, lá pelos idos de 1980.
Entretanto, um fato absolutamente fortuito, circunstancial, ocorrido um pouco antes, em 1977, me colocou como testemunha de um acontecimento importante, que marcou a vida dos estudantes e da própria população de Pelotas à época.
Naquele ano – 1977 -, eu cursava o 2° Grau no Colégio Santa Margarida e residia na Rua Anchieta, bem em frente à escola.
O Ricardo Pereira, conhecido entre nós como “Baixinho do Assis” (é irmão do Arnóbio), morava comigo, e, comunista de carteirinha, inventou de irmos a uma manifestação de estudantes no Largo da Faculdade de Direito, a meia quadra da nossa casa. A tal manifestação, em protesto contra a ditadura militar, era para ser “meio secreta”, só que, naturalmente, todo mundo ficou sabendo, os estudantes, a imprensa, e, principalmente, a polícia.
Chegados ao Direito, sentamos em círculo, bem em frente às escadarias, num clima de emoção e de muita apreensão. Após algumas palavras de ordem ditas pelos estudantes, e de cantarmos a música “O que será”, do Chico Buarque, o Gastalzinho (filho do ex-prefeito de Pelotas João Carlos Gastal) levantou-se e disse mais ou menos assim: “Liberdade não se pede, liberdade se pratica!”; depois, utilizando um graveto, convidou a que os companheiros escrevessem a palavra (que era totalmente proibida à época) no chão, na areia.
Escritas, uma a uma, as letras “L”, “I”, “B” “E” e “R”, a polícia irrompeu na Praça, com cavalos, armas e cassetetes; foi uma dispersão danada, com todo mundo correndo, para não ser preso e para não apanhar.
Pois no último sábado, quase 32 anos depois, os estudantes que participaram daquele ato retornaram ao Largo do Direito para inaugurar duas placas: “Aqui, mijamos na ditadura”, diz a primeira, numa alusão irreverente ao enfrentamento com as forças da repressão; e “Liberd...” a palavra proibida de então, ainda incompleta (e com uma letra a mais) como em 1977, quando escrita na areia, antes da debandada dos manifestantes.
Como há três décadas, eu estava lá novamente, relembrando que fui testemunha, ainda que coadjuvante, de um acontecimento histórico, marcado pela violência policial e pela prisão do Gastalzinho.
Desta vez, porém, ao contrário de 1977, não havia nenhuma polícia – civil, federal ou militar – para constranger os manifestantes, que puderam, enfim, dizer todas as palavras que ficaram trancadas nos terríveis “anos de chumbo”, ainda que palavras simples, como democracia, como liberdade.
E esta última, a razão maior de tudo, a razão maior da vida, pôde finalmente se fazer presente e ouvir o nosso melhor agradecimento: - Obrigado, Liberdade!
Para começar, quero deixar bem claro que eu não tive nenhuma participação importante no movimento estudantil no referido período, muito embora tivesse feito parte do DCE do Direito da Federal, a convite do meu amigo Luís Carlos Gastal, que foi Presidente do Diretório, lá pelos idos de 1980.
Entretanto, um fato absolutamente fortuito, circunstancial, ocorrido um pouco antes, em 1977, me colocou como testemunha de um acontecimento importante, que marcou a vida dos estudantes e da própria população de Pelotas à época.
Naquele ano – 1977 -, eu cursava o 2° Grau no Colégio Santa Margarida e residia na Rua Anchieta, bem em frente à escola.
O Ricardo Pereira, conhecido entre nós como “Baixinho do Assis” (é irmão do Arnóbio), morava comigo, e, comunista de carteirinha, inventou de irmos a uma manifestação de estudantes no Largo da Faculdade de Direito, a meia quadra da nossa casa. A tal manifestação, em protesto contra a ditadura militar, era para ser “meio secreta”, só que, naturalmente, todo mundo ficou sabendo, os estudantes, a imprensa, e, principalmente, a polícia.
Chegados ao Direito, sentamos em círculo, bem em frente às escadarias, num clima de emoção e de muita apreensão. Após algumas palavras de ordem ditas pelos estudantes, e de cantarmos a música “O que será”, do Chico Buarque, o Gastalzinho (filho do ex-prefeito de Pelotas João Carlos Gastal) levantou-se e disse mais ou menos assim: “Liberdade não se pede, liberdade se pratica!”; depois, utilizando um graveto, convidou a que os companheiros escrevessem a palavra (que era totalmente proibida à época) no chão, na areia.
Escritas, uma a uma, as letras “L”, “I”, “B” “E” e “R”, a polícia irrompeu na Praça, com cavalos, armas e cassetetes; foi uma dispersão danada, com todo mundo correndo, para não ser preso e para não apanhar.
Pois no último sábado, quase 32 anos depois, os estudantes que participaram daquele ato retornaram ao Largo do Direito para inaugurar duas placas: “Aqui, mijamos na ditadura”, diz a primeira, numa alusão irreverente ao enfrentamento com as forças da repressão; e “Liberd...” a palavra proibida de então, ainda incompleta (e com uma letra a mais) como em 1977, quando escrita na areia, antes da debandada dos manifestantes.
Como há três décadas, eu estava lá novamente, relembrando que fui testemunha, ainda que coadjuvante, de um acontecimento histórico, marcado pela violência policial e pela prisão do Gastalzinho.
Desta vez, porém, ao contrário de 1977, não havia nenhuma polícia – civil, federal ou militar – para constranger os manifestantes, que puderam, enfim, dizer todas as palavras que ficaram trancadas nos terríveis “anos de chumbo”, ainda que palavras simples, como democracia, como liberdade.
E esta última, a razão maior de tudo, a razão maior da vida, pôde finalmente se fazer presente e ouvir o nosso melhor agradecimento: - Obrigado, Liberdade!