domingo, 21 de dezembro de 2008

DUAS HISTÓRIAS ONDE O DINHEIRO NÃO TEVE A MÍNIMA IMPORTÂNCIA




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Anos 70, época ainda do movimento hippie, revolução dos costumes, anos de chumbo por aqui, o Pedro Bittencourt, o Zéca do Valentim, o Zé Paulo e o Camões Avirelis, depois de uma excelente noitada, saem sem dormir do Arroio Grande e rumam para a Praia do Hermenegildo, em busca de sabe se lá o quê...
Depois do atalho por Santa Isabel, já na BR, lá pela altura da Capilha, o Opala Azul do Pedro acusa a iminente falta de gasolina; o Posto Ipiranga, no Taim, torna-se parada providencial.
Chegados ao Posto, mais cerveja, o Pedro pede Vinícius de Moraes, o Zé Paulo tira o violão do porta-malas, o Zéca prepara o vozeirão e a cantoria rola solta em plena beira de estrada.
Terminado o abastecimento, o Avirelis, declamando o “Soneto de Fidelidade”, se antecipa ao Pedro para pagar a conta. Aproxima-se do bombeiro, retira o equivalente a uns R$ 200,00 (em valores de hoje, óbvio) e alcança as notas, exclamando tropegamente: – Podes ficar com o troco, que hoje eu ‘to’ apaixonado! O rapaz, olhando àquele bando de loucos, já de saco cheio com a bagunça, responde ao Camões: - O Sr. ta é bêbado, a essa hora da manhã! O Avirelis espicha a mão, retoma o dinheiro, conta nota por nota e entrega o exato valor marcado na bomba para o funcionário: - Ta aqui o pagamento certinho; me dá o troco de volta que tu não tem sensibilidade. E embarca no Opala, ofendidíssimo.
Então não dava para perceber que tudo aquilo era uma demonstração de paixão? Paixão pela arte, paixão pela liberdade, paixão pela vida... Onde já se viu confundir tamanha paixão com bebedeira, onde já se viu!?!
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Verão de 1986, preços congelados pelo “Plano Cruzado”, saímos eu, o Birinha do Gita, o Kiko da Candinha e o Neneco Silveira a viajar pelo País e fomos até a Praia de Guarapari, no Espírito Santo. Lá, íamos sempre ao mesmo Bar, somente para beber; coisa de uns quarenta chopes e um litro de uísque por noite, na média.
O Neneco, que havia recebido uma boa grana, resolveu inaugurar uma moda: nós dividiríamos a conta por três e ele daria a gorjeta, com um detalhe: a gorjeta seria sempre no valor igual ao do consumo. A cada noite, contas de três dígitos, e o Neneco sempre dando a mesma quantia para o garçom. A coisa ia assim até chegar o fim-de-semana quando fomos avisados que, por ser sábado, as mesas somente seriam ocupadas por quem fosse jantar, o que não era o nosso caso, já que apenas bebíamos, no máximo beliscando algum petisco.
Já nos preparávamos para sair quando o nosso garçom de todos os dias, um chileno de Valparaíso, percebendo que iríamos embora, virou-se para o gerente e gritou, num portunhol claríssimo: – Acá! Mesa once para los muchachos! – dizia, apontando para nós – E pide cuatro filés com fritas e no necessita servir, que com ellos yo me acerto! – garantiu, o que acabou mesmo acontecendo.
Ao final, não comemos nada, pagamos o mundaréu de bebidas e o Neneco deu a gorjeta de sempre. E o chileno acertou a conta, fácil, fácil, fácil...

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