sexta-feira, 27 de abril de 2012

CERTAS MANHÃS DE ABRIL(*)

Final do mês de abril do ano de 1990 (**).
Em poucos dias, o Rogério Espíndola (Geco) e o autor desta página deixariam Arroio Grande e Pelotas e partiriam para Lisboa - Portugal, numa aventura que teve início depois de uma madrugada em que os dois beberam mais de duas caixas de cerveja - na "Beth Bolacha" (localizada na XV de Novembro, esquina Voluntários à época) -, esperaram o banco abrir, rasparam as respectivas contas bancárias e, no limite, compraram as passagens rumo à capital dos lusitanos, numa viagem maluca, sem qualquer previsão de retorno.
Sabedor da partida dos amigos, o Carlinhos Bessa Martins (que havia metido na cabeça que era "devedor" do autor da página em razão de uns serviços que este lhe prestou como advogado), resolveu "pagar" os honorários, estipulados (por ele mesmo) inicialmente em "duas sacas de feijão, uma saca de milho, dez quilos de cebola e cinco de tomate", tudo culturas que o Bessa jurava que iria produzir na chácara da namorada, interior de Pedro Osório.
Frustrada a "safra", o Carlinhos resolveu trocar o "pagamento", e decidiu quitar os honorários patrocinando um churrasco de despedida para o seu advogado e alguns amigos de Arroio Grande e de Pelotas, todos reunidos em Pedro Osório, mais precisamente num clube do Cerrito, distrito de Pedro Osório à época.
Na foto (sempre da esquerda para a direita - de cima para baixo) os personagens de um encontro único, inesquecível:
Eraldo Lopes Machado, Pedro Bittencourt Jr (Juninho), Fábio Bonneau, Vanfredo Ghan (Ganso) e Luís Carlos Gastal;
Ricardo (Donga) Freitas, Birinha (Gita), João Luís Garcez, Rogério (Geco) e Plínio Cavalheiro Salles;
Gordo (P. Osório), Mário (P. Osório), Sílvio Lima (Silvinho), Carlinhos Bessa Martins, Jacques Chiachio, Otacílio (Lila) Cortez e Claudionir (Kiko) Coelho.
Por diversas vezes pensei em promover o reencontro desta turma (antes que outros resolvam fazer como o Jacques, que resolveu nos deixar...); por diversas razões, porém, a ideia não vingou, no próximo abril, quem sabe...
(*) Certas canções de abril é o título de uma composição inédita, feita em parceria entre o autor da página e o Basílio Conceição, quando moraram juntos em Pelotas, na primeira metade dos anos 80.
Como todos sabem, o Basílio morreria no início de abril de 1990 (vítima de acidente de carro, em Rio Grande), cerca de um mês antes do encontro de Pedro Osório, que reuniria muitos dos seus amigos.
(**) Até hoje não tenho certeza se esse encontro foi no último domingo de abril, ou no primeiro domingo de maio de 90, quem lembrará???

sábado, 21 de abril de 2012

POESIA-MEMÓRIA

Publicado em abril de 1965, o soneto "Ruínas" (acima) transformou-se num clássico da poesia local. O autor, Lauro Machado, poeta sensível e delicado, colaborou com vários poemas para o jornal "A Evolução" e outros periódicos da região.
Lauro Machado aparecerá futuramente aqui na página, numa pequena biografia, como "personagem do Arroio Grande".
Por enquanto, ficam os versos de "Ruínas" (dedicado à mãe do poeta, Augusta), para a apreciação dos leitores.
Ruínas
(À Minha Mãe)
Velha choça deserta, desprezada,
Vencida, mas de pé, em desalinho,
Tu lembras uma enferma abandonada
Num leito de destroços no caminho.
...
Tão triste, comovida e torturada,
Infeliz como um pássaro sozinho
Tu recordas assim desconsolada
A solidão daquele passarinho
...
Que dolorosa predestinação!
Tu vais vivendo como vive a gente
De tédio, desencanto e solidão...
...
E nós, também acumulando escombros,
Vamos sentindo, amarguradamente,
Os destroços da vida sobre os ombros.

(Lauro Machado - A. Grande, abril de 1965)

sexta-feira, 13 de abril de 2012

PERSONAGENS DO ARROIO GRANDE (VII) - JOÃO TEIXEIRA, O "MARTA ROCHA"

A sequência do verso "minh'alma clama a liberdade em que vivi", onde o Basílio diz - "sabe que existe outro caminho por aí", na canção Delírio (postagem abaixo), tem a sua origem numa frase de João Fernandes Teixeira - o Marta Rocha - figura ímpar da Cidade, que viveu em Arroio Grande de 1942 até 11/12/1978, quando faleceu precocemente aos 36 anos de idade.
"Eu sei que existe outro caminho por aí!" - no original - era uma frase que o Marta Rocha utilizava com certa frequência, referindo-se ao período da ditadura militar que se instalou no Brasil (1964-1985), e que, especialmente no período em que o Marta viveu o seu amadurecimento político, literalmente ditava os caminhos das pessoas na Cidade, no Estado e no País.
Em razão disso, isto é, da aspereza e do confronto característicos do período, Marta Rocha costumava apontar o dedo para as pessoas - seus interlocutores ou meros assistentes dos verdadeiros shows de oratória que ele proporcionava - disparando a expressão contundente, cunhada na luta de ideias que a esquerda travava contra a ditadura política e policial de então.
Inteligente e falastrão, irreverente e beberrão*, o Marta - que tinha esse apelido em razão do longos cabelos loiros, que os amigos comparavam aos da conhecida beldade baiana Marta Rocha, eleita Miss Brasil no ano de 1954, mas que se tornaria famosa por perder o título de Miss Universo nos EUA por alegadas "duas polegadas a mais" (uma versão divulgada por um jornalista da Revista "O Cruzeiro", jamais comprovada, mas que mexeu com o orgulho nacional) -, João Teixeira foi um tipo extraordinário da Cidade, especialmente pelo que representou no cenário político, como "guru" da esquerda local - do antigo trabalhismo ao MDB.
Ficaram célebres os discursos que Marta Rocha e Pedro Jayme Bittencourt - ambos exímios oradores - desfilaram nos palanques da cidade nos anos 60 e 70, quando, se utilizando de extraordinários argumentos retóricos, desafiavam o medo infundido pelos poderosos da época, e conclamavam as pessoas a buscarem "outro caminho" para o Arroio Grande, para o Rio Grande e para o Brasil, especialmente através do voto.
Assim os ativistas políticos ajudaram a eleger os irmãos Lauro (1963) e Ney Cavalheiro (1972) como Prefeitos de Arroio Grande (únicos prefeitos "de esquerda" eleitos na cidade em mais de 5 décadas), assim eles encantaram gerações de espectadores que não cansam, até hoje, de exaltar os dotes de oratória da dupla de tribunos.
De ofício "Rábula" (espécie de advogado que pratica a profissão sem ser diplomado), Marta Rocha foi também desportista, inclusive presidindo o Grêmio Esportivo Internacional logo em seguida à passagem dos primeiros 25 anos do Clube Caturrita (1971), mas foi mesmo como ativista político e como mentor intelectual de parte da geração da sua época que João Teixeira acabou lembrado, e, também, por um certo mistério que a sua personalidade "anti-social" deixou, fruto, ainda, da sua breve mas marcante passagem como personagem da cidade.
*Um pouco antes da morte de Marta Rocha, o autor da página, então com apenas 17 anos de idade, e quase sempre acompanhado do músico Basílio Conceição, costumava encontrar-se com o famoso personagem no Bar Quitandinha, localizado bem no cruzamento das ruas Dr. Dionísio de Magalhães e Júlio de Castilhos, para, entre discussões intermináveis e beberagens homéricas, testemunhar todo o talento e o extraordinário poder de retórica do homem que marcou toda uma época do Arroio Grande.
- A página ainda está esperando uma fotografia melhor do Marta Rocha, prometida que foi por amigos e familiares dele; a foto lá de cima é um “recorte” e mostra o Marta ao fundo do Bar “Meu Cantinho”, provavelmente entre os anos 1967/1969.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

DELÍRIO

Basílio Conceição (1953-1990).
Foi mais ou menos por esta época (começo de abril) que o Basílio morreu, no já distante ano de 1990.
De lá para cá o Basílio - bancário, comerciário, ruralista; poeta, músico, compositor; diabo, louco, inconsequente; amigo, parceiro, irmão - virou ícone, virou mito, virou Basílio Conceição.
Vinte e dois anos depois, o recado dele - do músico Basílio - ainda permanece forte, agudo, contundente, como nas estrofes de Delírio, uma das primeiras composições conhecida do arroiograndense, um poema gerado ainda nos tempos difíceis do final dos anos 1970, início dos anos 80, tempos de solidão, de incertezas, de busca por caminhos, de sonhos de liberdade.
Os versos de Delírio são um símbolo do cancioneiro do "Diabo", uma marca que se apresenta atual ainda hoje, mais de 30 anos depois da sua criação.
Para quem quiser conhecer...
Delírio
"Minha glória é estar só
e não querer mais do que isto:
revirar este deserto;
minha sombra pelas ruas,
não refaz nenhum tormento
vive apenas ao acaso...
Mas naõ me venham com rosas
nem compaixão
'inda prefiro a flor do campo
e esta negra solidão.
Quero tão somente a paz
e a imensidão das madrugadas,
este amor calamidade...
me sentir latente e estar
na mente insana dos amigos
que infernizam a cidade.
Minh'alma clama a liberdade
em que vivi,
sabe que existe outro caminho
por aí
e vai...
volvendo novos vendavais pelo país
é um delírio que me invade o coração
e me faz feliz!"