Uma antiga questão, da existência ou não do que se chama de “alma coletiva”, vem a tona sempre que surgem fatos impactantes que alteram o cotidiano de uma cidade.
A pergunta que se faz é bastante simples, embora de difícil resolução. Pergunta-se: é possível rotular-se uma cidade inteira com base na inclinação de parte dos seus habitantes? Existem cidades “trabalhadoras”, existem cidades “preguiçosas”?Existirão cidades “atuantes”, cidades “omissas”? Ou, o que é bem mais complexo: Existem cidades saudáveis? Existem cidades doentes?
A questão é instigante e quem tiver a melhor resposta que jogue aí na rede para que a gente possa buscá-la. E tentar entender.
Tentar entender, por exemplo, o que está acontecendo com Arroio Grande, a “Cidade Simpatia” – um lugar tranquilo, hospitaleiro, acolhedor–, que, de repente, vem se transformando, nos últimos tempos, no centro das notícias das páginas policiais do Estado, mas não por acontecimentos simples, triviais, senão que por fatos bastante fortes, contundentes, gravíssimos. E, o que é pior, quase todos acontecimentos protagonizados por menores de idade – infantes, adolescentes, jovens –, aqueles, enfim, que deveriam exprimir o futuro da cidade.
Menores infratores, é certo, mas também menores vítimas de uma sociedade doente, que aposta que a saída do anonimato pode estar na execução de um tiro, de uma facada, no apertar de um botão da net para ser notado, imitado e até – pasme-se! – invejado. Resultado: exibicionismo e crimes.
Hoje se agride, se fere, se mata, se faz qualquer coisa para ser “curtido”, “comentado”, “compartilhado”. Somos uma sociedade demente, que compartilha simplorice, comenta futilidades e curte desgraças como nunca. Estamos, sim, doentes, e, o que pior, assistimos ao resultado da nossa enfermidade sem esboçar qualquer reação ante a intolerância, a agressividade e a loucura que repercutem principalmente nos jovens que deveriam protagonizar o futuro da sociedade.
Sim, porque quem está ameaçado não somos nós, velhos inúteis, que fracassamos na construção do mundo “justo e igualitário” que sonhávamos para os nossos filhos. Quem está ameaçada é a menoridade, é a adolescência, a infância, que não soubemos cuidar, em meio ao nosso permanente prazer pela futilidade, por “curtir”, “comentar” e “compartilhar” a vida dos outros muito antes de cuidar da nossa.
E, nesse bisbilhotar contínuo do “quintal do vizinho”, permanecemos paralisados, sem mostrar qualquer reação, sem fazer nada que preste, apenas espiando, espiando, espiando...
E, quando não se mostra reação, quando se vive na superficialidade, ou a gente está doente de preguiça, ou a gente está doente de caráter, restando esperar para saber mais tarde afinal qual é a pior dessas moléstias.
De qualquer modo, ambas as doenças doem, e a dor que vai cortar mais fundo na alma da cada um é, às vezes, apenas uma questão de tempo.